novembro 13, 2010

Um Cara Chamado Togui

Conheci um cara chamado Togui. Andando pelas ruas de Belém, sob este sol escaldante de Belém, era um cara diferente desses tipos comuns de Belém. Durante horas, entregamo-nos a conversas intermináveis sobre os bares, as festas, as pessoas, conversas essas regadas a muita cerveja. Tagarelamos tanto que o sol do início da conversa, agora estava se pondo.
Togui era um cara bom de papo, desses que sabem falar coisas sérias sem parecer um chato metido a intelectual, desses que falam besteiras divertidas que toda mulher adora ouvir, uma figura. Usava uma touca de lã azul-clara, o que era muito, muito estranho. Porque ninguém normal usa touca de lã nessa cidade. Então eu, depois de alguns copos, criei coragem e perguntei: “Por que tu ta de touca?”.
“Porque tu ta de calça jeans? Também é roupa de frio. Não combina com Belém.”  E eu tive que admitir a verdade dessa observação. Grande Togui!
Apesar de aparentemente não se importar com a aparência, reparei que sua barba estava feita, e que a pele era bem cuidada. Togui era um cara bonito. Mas seu charme não estava na beleza, e sim na simplicidade. Ele dizia coisas que todo mundo sabe ou diz saber, a diferença era que ele realmente levava tudo o que dizia a sério. Por exemplo, ele parecia mesmo acreditar que as aparências eram detalhes, e que o verdadeiro valor de todos estava no coração. Este, sim, guiava seu caminho. Falava pra mim que nunca sabemos o dia de amanhã e que, por isso, devemos estar destituídos de preconceitos, mediocridades. Falava que devemos nos preocupar não em sermos felizes, mas em fazermos os outros felizes, pois quando fazemos os outros felizes, os outros nos fazem também. Confesso que nisso eu nunca tinha pensado.
Lembra daquela frase já bastante batida por aí, “com as pedras que me jogarem eu construo um castelo”, ou qualquer coisa assim? Togui foi além: “As pedras não são tão importantes, porque são metáforas, Nathália. O que importa é quem ta jogando, porque esses podem te machucar de verdade.” 
Caramba! E eu que achava que tava abafando quando dizia que ia construir um castelo!  
Anoiteceu e tivemos que nos despedir. Preferimos não marcar nada, deixar o acaso se encarregar disso. E foi legal porque, nesse sentido, ele era como eu: gostava de ser livre e qualquer coisa mais previsível que o acaso já não era tão atraente. Se você vir um cara de touca de lã azul clara por aí, com a barba feita e o jeito esquisito, diga que eu lhe mandei um abraço, por favor.

Um comentário:

  1. Fazer uma análise de caracteres nunca é fácil, mas tenho observado que você consegue isso com narrativas de cenas e fatos do seu cotidiano recriados pela imaginação aliada a uma visão filosófica da realidade e que se expressam por uma linguagem bem trabalhada e muito comunicativa.

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